Esta é a mala de couro que contém a famosa coleção. Reparem nas minhas mãos, vazias. Meus bolsos também estão vazios. Meu chapéu também está vazio. Vejam. Minhas mangas. Viro de costas, dou uma volta inteira. Como todos podem ver, não há nenhum truque, nenhum alçapão escondido, nem jogos de luz enganadores. Ana Cristina Cesar
18 novembre 2005
efeito cardigans
Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo o dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.
Cecília Meireles, Cânticos VI
O que somos além de memórias que vão-se apagando... O que deram os nomes de alma ou espírito são apenas lampejos de consciência que, algum dia, irrecuperavelmente, desaparecerão. Todas as nossas experiências fracassadas ou não, momentos felizes ou amargos, tudo o que carregamos dentro de nós, nossos sentimentos terão se extinguido, como uma fogueirinha no meio da neve. Teremos literalmente desaparecido. Durante o percurso, muito provavelmente não teremos alcançado o que tanto almejávamos. Talvez tenhamos caminhado uma infinidade de quilômetros e, no meio dele, já teremos esquecido o que era mesmo o que tanto queríamos. E lá teremos ido nós, com nossos amores, desejos, ideais, músicas, filmes, os rostos que não queríamos nunca esquecer. E os livros. Ah, os livros! Tudo se dissolvendo como as imagens de um álbum de fotografia que vamos folheando, os momentos ali congelados em olhares e gestos petrificados. Pensava nisso enquanto ouvia Cardigans e suas músicas carregadas de melancolia, a voz doce da Nina Persson misturando-se à leitura de Gorki, acreditam? Ler Gorki é estar disposto a cair num universo mergulhado em desolação. Nada além do nosso próprio universo, o real [o que é real?], sem maquiagens ou embalagens. Bem provável que eu tenha saído de casa depois disso, deixando o rascunho a lápis. A voz de Nina ecoando sob o calor abafado de um feriado. O calor que você [diz] odeia com todas as suas forças.
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