28 octobre 2006

Sobre anjos e outros grilos




Com um cigarro entre os dedos, ela se debruça sobre sua vida. Diante dela, centenas de camundongos brancos e inocentes, correndo perdidos por todos os lados. Mas seus olhos atravessam essa imagem. Olham para o nada. Pobres camundongos brancos, à mercê de uma ciência inútil. Mas ela pensava era em outra coisa. Pensava na sua mente paralisada. Seu corpo também está paralisado. Ontem, a caminho da parada de ônibus, percorrendo a longa avenida, percebeu que não sente seus pés pisando no chão. Ontem, lembrou-se do onteontem. Chico Buarque cantando em seus ouvidos numa ensolarada manhã de desenho animado, com borboletas laranja e joaninhas a pousarem em seu braço. Um sorriso estampava-se no rosto com uma doce voz a lhe sussurrar... com açucar, com afeto... Esse dia prenuncia coisas boas, pensou. A noite, no entanto, foi de pesadelos. Sonhava que seus sonhos desmoronavam. Que borboletas laranja e dias ensolarados não passavam de alucinação. Hoje, pensou no ontem. Sem Chico Buarque, sem direção, sem alma. Surdo-muda. Enfim, lembrou-se da noite de ontem e o sorriso esboçou-se novamente em seu rosto. As borboletas e joaninhas é que tinham razão. Agora ela vê anjos por toda parte.

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